CABRAL, FRANCISCO (1553?-?). Nasceu em São Miguel, Açores, Portugal, por volta de 1533, filho de Aires Pires Cabral, Juíz do Reino, e de Francisca Nunes de Proença, de família fidalga francesa. Aprendeu as primeiras letras em Lisboa e estudou Humanidades em Coimbra. Em 1550 alistou-se como soldado na expedição de Afonso de Noronha, vice-rei da Índia, e em Outubro de 1552 lutou contra Pisbeg, general turco que sitiava o enclave de Ormuz. Por António Vaz conheceu a vida e as actividades dos Jesuítas. Em Dezembro de 1554 abandonou as armas e entrou para a Companhia de Jesus. Antes de se ordenar sacerdote (1558-1559) foi nomeado mestre dos noviços, passando, em 1561, a ocupar a cátedra de teologia. Em Fevereiro de 1562 foi nomeado reitor do colégio de Baçaim, por quatro anos, mas depressa regressou à cátedra de teologia moral. Em 1567 foi reitor do colégio de Cochim, mas depressa regressa a Goa, de cujo colégio foi também reitor por pouco tempo. Nomeado superior de Macau e da missão do Japão, como sucessor de Cosme de Torres, chegou a Macau em Agosto de 1568. Aqui teve algumas contendas com Organtino Soldo, que chegou no ano seguinte, e foi com ele que chegou ao Japão a 18 de Junho de 1570. Sem experiência do ambiente japonês, convocou o conselho da missão para adoptar certas reformas ordenadas pelo provincial da Índia, António Quadros: o retorno da sotaina negra de algodão, em vez de uma vestimenta parecida à dos bonzos budistas, adoptada pelos Jesuítas do Japão durante três lustros. A segunda reforma foi o envio do modesto capital da missão do Japão para a Índia, para adquirir rendas fixas e conciliar os desvios encomendados a comerciantes portugueses. Pouco tempo depois, Cabral reconheceu que o sistema não passava de uma utopia e, como o anterior provincial Melchior Nunes Barreto na sua breve visita, em 1556, fez marcha atrás. Cabral, ao contrário, reformou o método evangelizador do seu antecessor Cosme de Torres, em prol de uma sistematização do trabalho, no estilo dos Jesuítas da Índia. Cabral dedicou o seu primeiro ano a visitar as igrejas da ilha de Kiushu, tendo Luís de Almeida como intérprete, e, no ano seguinte, empreendeu uma viagem à capital Kyoto, “levando comsigo somente, por lingua e companheiro, o irmão João de Torres, que o padre Cosme de Torres baptizou em Yamaguchi nascido de oito dias”, (como escreveu Luís Fróis) ambos vestidos de sotaina e manto. No porto de Sakai foram recebidos por Organtino e pelo irmão meio cego Lourenço, de cabeça rapada à maneira dos bonzos e vestidos com quimonos de seda. Organtino recusou-se a vestir a sotaina preta. Para Cabral era urgente ver o estado da cristandade na capital e marcar presença no meio da nobreza, com visitas de cortesia ao imperador Ashikaga e ao Daimio Oda Nobunaga, entre outros. De regresso à zona de Kiushu dedicou-se a cumprir o seu ofício de superior, até que, em 1578, o Daimio Otomo Yoshishige de Bungo tentou reconquistar o senhorio de Hyuga (Miyazaki) – usurpado pelo dáimio de Satsuma – com o plano de instituir uma república cristã no estilo dos reinos da Europa, prevista para cristianizar todo o Japão. A campanha terminou com um fracasso rotundo, na batalha de Mimikawa. Em 1579, o visitador Alessandro Valignano chegou ao Japão com plenos poderes e Cabral retirou-se para segundo plano. Em 1581, com a desculpa, verdadeira, da sua pouca saúde, mas na realidade para evitar atritos, pediu o relevo como superior da missão. Valignano acedeu, nomeando-o superior da comarca de Bungo, com residência em Usuki, mas em Fevereiro de 1583 chamou-o a Macau para o encarregar dos Jesuítas desse porto, enquanto Valignano realizava a viagem à Europa com os jovens legados japoneses. Cabral apoiou o desenvolvimento da missão chinesa preparada por Michelle Ruggieri, desde 1579, entrando pouco depois no império para visitar os Jesuítas de Zhaoqing. Em 1586, Valignano propô-lo para a Casa Professa de Goa (1587-1592), e a continuação provincial da província goesa (1592-1597). Terminando em Setembro o seu provincialato, Cabral continuou como predicador e confessor até ser nomeado novamente proposto (c. 1605), prefeito espiritual e consultor da província. Morreu em Goa, numa quinta-feira Santa, a 16 de Abril de 1609. Cabral foi uma figura controversa, com evidentes defeitos, ou melhor, excessos, mas pela sua rectidão como religioso, pelas suas inegáveis virtudes e pelo seu grande espírito apostólico, gozou da estima dos seus superiores, António Quadros e Francisco Rodriguez, mas não tanto dos visitadores Organtino Soldo e Alessandro Valignano, com quem teve alguns sérios atritos. A sua auto-suficiência pessoal, ligada a uma certa falta de flexibilidade e tacto no trato com os Jesuítas da missão, tirou em parte o brilho à sua actuação como superior de Macau-Japão (1569-1581). Sobrestimou os valores portugueses, chegando a menosprezar a raça japonesa e os restantes asiáticos ou europeus não portugueses. Apesar disso, teve atitudes dignas de louvor, como a consolidação da escola de línguas ou a admissão de bastantes noviços japoneses na Ordem, ainda que por Ordem do visitador. Bibliografia: SCHÜTTE, Josef F., Valignano’s Mission Principles for Japan, vol. 2, (St. Louis, 1980); SCHUTTE, Josef F., Introductio ad Historiam Societatis Jesu in Japonia 1549-1650, (Roma, 1968).

Informações relevantes

Data de atualização: 2020/04/17