Informações relevantes
Data de atualização: 2020/07/17
Surgimento e mudança da Ribeira Lin Kai de San Kio
Macau e a Rota da Seda: “Macau nos Mapas Antigos” Série de Conhecimentos (I)
Escravo Negro de Macau que Podia Viver no Fundo da Água
Que tipo de país é a China ? O que disseram os primeiros portugueses aqui chegados sobre a China, 1515
Data de atualização: 2020/07/17
ABEEL, DAVID (1804-1846). De nome chinês Ya Bili 雅裨理, é, juntamente com Elijah Bridgman (1801-1861) e Samuel Wells Williams, um dos primeiros missionários norte-americanos a estabelecer-se na China. Oriundo de New Brunswick (Nova Jersey), Abeel estuda no Rutgers College e no Seminário Teológico dessa cidade, desenvolvendo o seu primeiro trabalho pastoral em Athens (Nova Iorque) durante dois anos. O jovem viaja, enquanto missionário da Dutch Reformed Church, para a China, em 1829, como capelão da Seaman’s Friend Society (em Whampoa), tendo o mercador norte-americano D. W. C. Olyphant pago a sua passagem e a de Elijah, por iniciativa do Dr. Morrison. Um anos depois da sua chegada ao Sul da China, Abeel é empregado pela American Board of Commissioners for Foreign Missioners. Por motivos de saúde, o missionário abandona Cantão, em 1833, rumo a Java, ao Sião e a Singapura, visitando ainda a Europa, a caminho dos Estados Unidos, onde encorajaria a realização de futuras missões na China, encontrando-se com Harriett Low, em Inglaterra a 22 de Julho de 1834, onde ajuda a formar a Society for Promoting Female Education in the East. Abeel publica The Claims of the World of the Gospel (1838); The Missionary Conversion of Jerusalem e descreve as suas viagens no Journal of a Residence in China, and the Neighboring Countries; from 1829 to 1833, bem como a sua estada em Macau. A surpresa reina na descrição do enclave cuja aparência europeia (Praia Grande) contrasta com a esterilidade dos territórios e das ilhas ciurcundantes. O autor refere a superfície irregular da urbe, rodeada de campos cultivados, montes, aldeias dispersas, cenários aquáticos, e cuja aparência muda de acordo com a perspectiva ou o local de onde é vista, surpreendendo o visitante. Quanto aos edifícios, a variedade e o tamanho são as suas características mais importantes, encontrando-se a maior parte do território ocupado por chineses. Relativamente à população, e de acordo com uma estatística recente de que o autor tem conhecimento, habitam na cidade cinquenta mil pessoas, das quais quarenta e cinco mil chineses, embora alguns informantes afirmem que a população não excede os trinta ou os trinta e cinco mil habitantes. Macau é ainda a residência das mulheres e famílias dos comerciantes estrangeiros que se deslocam anualmente para Cantão, existindo aí cerca de onze famílias inglesas e uma norte-americana. O viajante resume a história do estabelecimento dos portugueses em Macau desde as lutas destes contra os piratas do mar da China, sendo os primeiros acusados pelos chineses de terem “usurpado” o local. Quanto aos “locais de interesse”, o texto descreve os jardins e a Gruta de Camões, refere a evangelização dos Jesuítas e a construção de igrejas e de um seminário, de onde abrem “contactos com vários pontos do interior” da China, criticando o mau caminho que a propagação da fé tomara na China. No seminário de São José, outrora posse dos Jesuítas, educam-se jovens chineses, às custas do governo português, para serem ordenados e enviados para a China profunda. Como muitos outros visitantes protestantes Abeel estranha o elevado número de igrejas (12) e padres (40) existentes face ao reduzido número de habitantes católicos. O olhar do autor, nem português nem católico, leva-o a descrever alguns factos, a que chama de “superstições”, relatados por habitantes da cidade, nomeadamente a crença em torno do auxílio de Santo António à cidade aquando da invasão holandesa, pois o mesmo aparecera nos ares e derrotara os invasores, milagre que pode ter sido também obra de São João Baptista, uma vez que a batalha teve lugar no dia deste último santo. O governo do território oferece a Santo António uma festa anual que dura treze dias, criticando Abeel os excessos praticados durante a mesma. Também o jornalista norte-americano W. W. Wood refere a “superstição” relacionada com Santo António. O missionário continua a sua reflexão ‘protestante’ e critica a vivência católica ao descrever a procissão de Santo António. O texto refere ainda a existência de templos chineses e descreve o Templo de Á-Má, “uma forma grotesca de superstição pagã”, referindo os serviços religiosos do missionário Robert Morrison na casa deste último, em prol dos sobrecargas da Companhia das Índias inglesa. Abeel aborda assim um dos factores que afastam, em Macau, a comunidade portuguesa das comunidades de língua inglesa, a religião. Em 1842, o missionário visita, de novo, Malaca e outras localidades asiáticas e funda a Missão de Amoy, regressando, doente, aos Estados Unidos, em 1844, vindo a falecer, vítima de tuberculose, dois anos depois. [R.M.P.] Bibliografia: ABEEL, David, Journal of a Residence in China, and the Neighboring Countries; with A Preliminary Essay, on the Commencement and Progress of Missions in the World, (Nova Iorque, 1836 [1834]); ABEEL, David, The Missionary Convention at Jerusalem. Or, an Exhibition of the Claims of the World to the Gospel, (Nova Iorque, 1838); ABEEL, David et alii, “Early Missionaries in Bangkok”, in FARRINGTON, Anthony (ed.), The Journals of Tomlin, Gutzlaff and Abeel, 1828-1832, (Bangkok, 2001); KITTS, Charles R., The United States Odyssey in China, 1784-1990, (Lanham, 1991); LOW, Harriett, “Lights and Shadows of a Macao Life: The Journal of Harriet Low”, in HODGES, Nan P.; HUMMEL, Arthur W. (eds.), Travelling Spinster-Part Two: 1832-1834, (Woodinville, 2002).
Abeel, DAVID
AUDEN, W. H. (1907-1973). Durante a sua viagem pela China (1937-1938) aquando da guerra sinojaponesa o poeta inglês W. H. Auden (Wystan Hugh Auden) recolhe, na companhia de Christopher Isherwood, impressões para redigir Journey to a War (1939), acabando por visitar Hong Kong, em Fevereiro de 1938, bem como Macau, entrepostos comerciais que descreve comparativamente em dois sonetos em verso branco redigidos em Bruxelas durante o mês de Dezembro de 1938. O poema “Macao” apresenta uma imagem dupla do território, sendo o exotismo e o prazer sem peso do pecado uma das suas principais características, esterótipos facilmente associados ao Oriente pelo turista ou viajante ocidental. Enquanto a comercial Hong Kong não agrada nem a Auden nem ao sujeito poético, Macau, “a weed from Catholic Europe”, ganhou raízes entre as montanhas e o mar. O texto lírico, predominantemente descritivo, apresenta um policromático ‘retrato’ do enclave através das suas casas alegres, um “exótico fruto” que simboliza a singularidade das vivências portuguesa e chinesa da cidade. O olhar protestante do “eu lírico” demora-se nas imagens e estátuas de santos de estilo rococó que prometem salvação aos jogadores, enquanto igrejas se acomodam, lado a lado, com casas de prazer, materialização espacial do “comportamento natural” do ser humano que a fé pode perdoar, imagem esta continuada nos tercetos. Erotismo rima, portanto, com exotismo, através do campo semântico constituído pelos adjectivos utilizados, por entre vielas e edifícios da urbe, recordando os relógios e sinos das altaneiras torres católicas que o inferno poderá esperar os mais temerosos que se entregam aos mistérios do Oriente, rodeados por uma vivência também ocidental. Macau é, como revela o símile botânico utilizado no texto, caracterizado como um “enxerto cultural” ou erva daninha luso-sínica, advindo daí a sua singularidade e o facto de o território representar metaforicamente as fraquezas ‘da carne’ e as virtudes da natureza humana. A dimensão exotica assume no poema uma sugestiva proeminência que se repete no imaginário ‘inglês’ relativamente a Macau e que recompensa o viajante que se depara com a familiaridade da “infantil”, porque inocente, porta de entrada do Ocidente na China. Bibliografia: AUDEN, W. H., Collected Poems, introdução e notas de Edward Mendelson, (Londres, 1991 [1976]); BAKER, Donald C.; BAKER, Elizabeth D., “A Great English Poet on China, Hong Kong and Macao: W. H. Auden and a “Weed from Catholic Europe””, in Review of Culture, 2.ª série, n.º 25, edição inglesa, (Macau, 1995), pp. 241-248; CARPENTER, Humphrey, W. H. Auden: A Biography, (Londres, 1981); DAVENPORT-HINES, Richard, Auden, (Londres, 1995); PUGA, Rogério Miguel, ““Macao” e “Hong Kong” de W. H. Auden: Uma Abordagem Comparativista”, in Administração: Revista de Administração Pública de Macau, vol. 15, n.º 55:1, (Macau, 2002), pp. 325-338.
AUDEN, W. H. (1907-1973)
José Inácio de Andrade nasceu no dia 2 de Novembro de 1780 em Santa Maria, Açores. Faleceu em Lisboa no primeiro dia do ano de 1863. Em Lisboa dedicou-se à vida política activa, tendo sido eleito vereador da Câmara Municipal de Lisboa em 1837. No biénio 1838-1839, Inácio de Andrade ocupou a Presidência da Câmara da capital portuguesa. Posteriormente veio a assumir o cargo de Director do Banco de Portugal. José Inácio de Andrade foi um homem do seu tempo, marcado cultural e ideologicamente por uma visão do mundo humanista e individualista, caracterizadora do pensamento liberal. Erudito e dedicado às letras, Inácio de Andrade escreveu em 1835 dois textos que foram publicados em Lisboa: Memória sobre a Destruição dos Piratas da China e o Desembarque dos Ingleses na Cidade de Macau e sua Retirada e Biografia de Rodrigo Ferreira da Costa. A sua ligação ao Oriente teve início nos primeiros anos de Oitocentos com um conjunto de viagens a Macau e à Índia como capitão de navios. Casou duas vezes e foi à sua primeira esposa, Maria Gertrudes de Andrade, que dirigiu as cartas que escreveu e que reuniu na obra Cartas Escriptas da India e da China, as quais constituem um conjunto de cem breves reflexões, publicadas pela primeira vez em dois volumes pela Imprensa Nacional, em 1843. Ao longo desta obra, o autor revela um conhecimento alargado sobre a China, adquirido através das suas viagens que o mantêm ligado ao Oriente durante vinte anos. Cem cartas recheadas de descrições e reflexões sobre o que ia observando e estudando, e que Inácio de Andrade dividiu em dois volumes. As cinquenta cartas que compõem o primeiro volume centram-se no início da sua viagem até à Índia, nalguns aspectos da civilização indiana, na viagem até Macau e à China e, finalmente, na milenar história chinesa. No segundo volume, composto pelas restantes cinquenta cartas, o autor lança um olhar sobre os diferentes aspectos que caracterizam a civilização chinesa, aproveitando para reflectir sobre outros temas. Estas reflexões ajudam-nos a compreender a sua linha de pensamento, com particular realce para as suas constantes comparações entre o Ocidente e as características do Império do Meio. As viagens realizadas por José Inácio de Andrade exerceram sobre o autor um natural fascínio, levando-o a enaltecer os aspectos mais positivos que foi encontrando no seu contacto com os povos e os lugares que visitou. Mantendo o quadro de valores civilizacionais e de referência do Ocidente visíveis na forma como aborda alguns temas, nas reflexões que elabora e nos autores que utiliza para criticar ou para servirem de suporte às suas análises (Adam Smith, Helvecio, Montesquieu, Voltaire, Abade Reynal, Hobbes, Fernão Mendes Pinto, Gaspar da Cruz, Jerónimo Osório, Tomé Pires, entre outros), Inácio de Andrade faz um esforço no sentido de valorizar o ‘outro’ face a si próprio. Não podendo deixar de sublinhar a erudição e a riqueza multidisciplinar que as Cartas Escriptas da India e da China ainda hoje nos revelam, importa destacar o modo como este autor coloca o seu racionalismo e os seus sentimentos ao serviço da civilização visitada, acabando por se render ao exotismo esmagador de um Oriente que, naquele tempo, ainda estava em grande parte por descobrir. Não obstante os limites que a obra revela, relativamente ao grau de profundidade e de precisão dos conhecimentos que nos transmite sobre as civilizações orientais, as Cartas constituem um objecto de estudo em si mesmas, pela riqueza do texto, pelos sentimentos que nos transmitem e pelas ideias que veiculam: o respeito e a admiração por outras civilizações, pelo diferente, base fundamental em que se alicerçou a secular presença portuguesa no Extremo Oriente. Bibliografia: DIAS, Alfredo Gomes, “As Cartas de José Ignacio de Andrade”, in Macau, n.° 1, (Macau, 2000), pp.78-88; ANDRADE, José Ignacio de, Cartas Escriptas da India e da China, (Macau, 1998).
ANDRADE, JOSÉ INÁCIO DE (1780-1863)
CARVALHO, RODRIGO LEAL DE (1932-). Nasceu na Praia da Vitória, Açores, em 20 de Novembro de 1932, tendo vivido parte da infância em Trás-os-Montes e no Algarve, para além dos Açores, onde fez a escolaridade e o Curso dos Liceus. Licenciou-se em Direito (Universidade de Lisboa), ingressando de seguida na Magistratura. Foi colocado na ilha do Pico em 1956 e, no ano seguinte, em S. Tomé e Príncipe, a que se seguiu Macau, onde viverá, se bem que de forma não continuada, cerca de quatro décadas, e a maior parte da sua vida activa. Em 1959 chegou ao Território como delegado do Ministério Público, onde ficou até 1963, ocasião em que foi colocado na Guiné como Juiz de Direito. Nessa qualidade voltou a Macau, em 1966, aqui permanecendo até 1971. Foi então colocado em Luanda, onde esteve ano e meio, sendo depois enviado para Moçambique, onde foi promovido à Relação, e donde saiu em 1975. Após uma curta estadia em Lisboa, na Direcção dos Assuntos Jurídicos do Ministério do Ultramar, regressou uma vez mais a Macau, em 1976, como Procurador da República, cargo entretanto criado no âmbito do Estatuto Orgânico do Território, e depois designado de Procurador-Geral Adjunto. Nele permaneceu até ser nomeado Presidente do Tribunal de Contas em 1996, lugar que deteve até às vésperas da transferência da Administração de Macau para a República Popular da China, regressando a Portugal ainda em 1999. Por impedimento, pediu, ao ser investido nessas funções, a suspensão dos cargos de curador da Fundação Macau e de membro do Conselho Universitário de Macau, que há anos vinha desempenhando. Rodrigo Leal de Carvalho viu os seus serviços serem reconhecidos pelo Estado português ao ser agraciado, em 1986, com o grau de Grande Oficial da Ordem do Mérito, enquanto que o Governador de Macau o distinguiu, em 1998, com a Medalha de Valor. Se bem que tenha despertado para a escrita ainda nos tempos do Liceu, só em 1993 deu à estampa o seu 1.º romance, Requiem por Irina Ostrakoff, o qual obteve tal aceitação pública que viria a ser reeditado logo em 1995. Galardoado com o Prémio Camilo Pessanha 1993, atribuído pelo Instituto Português do Oriente, foi recentemente (1999) publicado em língua chinesa e objecto da dissertação de Mestrado de Vânia Maria Pinto Coelho Reis. Em 1994 é a vez de publicar Os Construtores do Império, já esgotado, logo seguido, em 1996, de dois outros novos romances: A IV Cruzada, em que o autor em parte se assume como protagonista, e Ao Serviço de Sua Majestade, surgindo, em 1999, O Senhor Conde e as Suas Três Mulheres. Com fina ironia e delicadeza, Rodrigo Leal de Carvalho tem-se revelado um escritor das memórias da cidade de Macau e do universo do funcionalismo português de além-mar das décadas de 1950 e 1960, recreando ambientes e vivências testemunhadas por ele mesmo, sempre devidamente enquadradas no panorama da conjuntura mundial do século XX, o que despertou a atenção de outros investigadores como David Brookshow e Lee Shuk Yee. – Principais Obras. Romance – Requiem por Irina Ostrakoff, 1993 (2.ª ed., 1995); Os Construtores do Império, 1994; A IV Cruzada, 1996; Ao Serviço de Sua Majestade, 1996; O Senhor Conde e as Suas Três Mulheres, 1999. Bibliografia: BROOKSHAW, David, “Macau e os Macaenses: Considerações sobre a Obra de Henrique de Senna Fernandes e Rodrigo Leal de Carvalho”, vol. 2, (Porto, 1999), pp. 169-178; REIS, Vânia Maria Pinto Coelho, A Ironia em “Requiem por Irina Ostrakoff ”, policopiado, (São Paulo, 1999); SENA, Tereza; BASTO, Jorge, Macau nas Palavras, CD-ROM, (Macau, 1998).
CARVALHO, RODRIGO LEAL DE (1932-)
Autor de obras como As Mãos e os Frutos (1948), entre muitas outras, que visita Cantão e Macau, em Outubro de 1990, estada da qual é fruto o grupo de poemas intitulado Pequeno Caderno do Oriente, ilustrado por Carlos Marreiros e publicado no Jornal de Letras e na Revista de Cultura. O Caderno é composto por doze textos, nomeadamente poesias, apontamentos e prosas poéticas, alguns dos quais traduzidos para inglês e complementados pelas ilustrações de Carlos Marreiros, elaboradas em Novembro de 1993. O primeiro texto desenvolve-se em torno da figura do “mestre” Camilo Pessanha, o segundo, “Ofício da Paciência”, descreve a azáfama diária da vida na “Baía das Pérolas”, cuja ponte, rumo à Taipa, é comparada a uma garça, sendo a caracterização da cidade conse¬guida através da enumeração. O poema “Jardim de Lou Lim Leoc” (Lulianruo Gongyuan 盧廉若公園) funciona como repositório de memórias orientais, seguindo-se um texto narrativo e um poema sobre “As Pedras”, nomeadamente “A Pedra Profunda”, enquanto “As Montanhas Verdes” começa como um conto e termina como uma elaborada recordação de um amigo que desvendara a poesia da China ao sujeito lírico, que se encontra no Hotel Mandarim Oriental, observando as verdes montanhas do Império do Meio, a Baía da Praia Grande e o álbum de reproduções de pinturas de George Chinnery. Seguem-se o “Templo da Barra”; o “Canto Solar”, a “Balança” e um texto “Em Defesa de Camões”, que descreve o ambiente que envolve a mítica Gruta de Camões, pedindo ao Leal Senado que mande retirar as vergonhosas e medíocres composições poéticas que rodeiam o monumento. As impressões visuais continuam, agora em movimento, “[…] ardendo entre águas e a bruma”, descrevendo a “Aproximação de Coloane”. O último texto do Pequeno Caderno, intitulado “O Nome da Água”, descreve a visita ao cemitério onde se encontram as sepulturas de Camilo Pessanha e da sua família chinesa, poeta que “escrevera o seu nome na água”, conferindo assim uma ciclicidade temática à obra através de um dos mais conhecidos poetas portugueses que viveu em Macau. Bibliografia: ANDRADE, Eugénio de, “Pequeno Caderno do Oriente”, desenhos de Carlos Marreiros, in Revista de Cultura, n.° 18, 2.ª série, edição inglesa, Janeiro-Março de 1994, (Macau, 2002); ANDRADE, Eugénio de, Com Palavras te Amo, (Macau, 1990); NAVA, Luís Miguel, Eugénio de Andrade, 1957-1995, in col. “Essencial”, n.° 26, (Lisboa, 1987); ARRIMAR, Jorge de Abreu (coord.), Eugénio de Andrade: Exposição Bibliográfica, (Macau, 1990); ANÓNIMO, Eugénio de Andrade: Retratos, (Macau, 1990); ANÓNIMO, “Eugénio in Macau-Loving with Words”, in Review of Culture, edição inglesa, n.°s. 11/12, (Macau, Setembro de 1990-Fevereiro de 1991), pp. 111-119; ANÓNIMO, “The Alliances of Desire”, in Review of Culture, edição inglesa, 2.ª série, n.° 18, (Macau, Janeiro-Março de 1994), pp. 137-138; SANTOS, José da Cruz (coord.), Eugénio de Andrade: O Amigo Mais Íntimo do Sol: Fotobiografia, apresentação de Luís Miguel Nava e Ângelo Crespo, (Porto, 1998).
ANDRADE, EUGÉNIO DE (1923-2000)
Em 1745, Fr. José de Jesus Maria, que terá concluído neste ano a sua Azia Sinica e Japonica, dá-nos as seguintes informações: “De 1735 a 1745, Macau perdeu em naufrágios mais de 11 navios. Em 1745 a população de Macau é de 5 212 cristãos e 5 000 chinas gentios. Compare-se este numero com as 44000 almas que aqui viviam um século antes.Os portugueses do reino são apenas 90; os homens e crianças 1 911 e as mulheres 3 301, parecendo uma cidade de mulheres”. (Cfr. António Martins do Vale, Os Portugueses em Macau (1750-1800). Degredados, ignorantes e ambiciosos ou fiéis vassalos d’El – Rei?, Macau, IPOR, 1997, pp. 220,221,230 e 231).
Azia Sinica e Japonica
ANSON, BARÃO GEORGE (1697-1752). Almirante cuja rota da circum-navegação (1740- 1744) passa por Macau. Entre outras façanhas, Anson derrota a frota francesa no Cabo Finisterra em 1747, e, enquanto First Lord of the Admiralty (1751-1756, 1757-1762), leva a cabo importantes reformas navais, contribuindo para o sucesso de Inglaterra na Guerra dos Sete Anos (1756-1763). Após cerca de dois anos de viagem, em 12 de Novembro de 1742, encontrando-se apenas quatro embarcações da EIC no Sul da China, chega à rada de Macau, com o intuito de se reabastecer, o primeiro barco de guerra da Marinha Real inglesa, o H. M. Centurion, sob o comando de George Anson, que partira de Southampton em 18 de Setembro de 1740 para desequilibrar os interesses espanhóis, sobretudo no continente americano. Um dos membros da tripulação descreve a chegada à Taipa e o poder (cada vez mais nominal) dos portugueses em Macau. O enclave funciona como porto familiar e seguro durante longas viagens de embarcações europeias. Na China Meridional inúmeros barcos europeus necessitam de se reabastecer e de ser reparados, como é o caso do Centurion. O capitão inglês do Augusta, barco da EIC, informa Anson dos procedimentos habituais dos estrangeiros à chegada a Macau, nomeadamente o pedido de autorização às autoridades chinesas para entrar no rio de Cantão e as taxas alfandegárias que o Centurion teria que pagar, aconselhando o Comodoro a informar-se melhor junto do governador e do Senado de Macau, que, temendo represálias chinesas como as que a cidade sofrera ao receber o London e outras embarcações inglesas, aconselha Anson a atracar discretamente na Taipa e a não entrar no rio das Pérolas, pois caso o fizesse teria de pagar as taxas alfandegárias ao mandarinato cantonense. Os portugueses servem, mais uma vez, de fonte de informação sobre a China para visitantes estrangeiros, deslocando-se Anson, no segundo dia da sua estada, a terra para inquirir o governador sobre as possibilidades de adquirir mantimentos e reparar o barco. Este último responde que se vê forçado a pedir autorização às autoridades mandarínicas e, perante tal postura, o Comodoro, apercebendo-se de que apenas o vice-rei de Cantão poderia autorizar o reabastecimento e a reparação do Centurion, aluga um pequeno junco e dirige-se para Cantão, onde, após aconselhar-se junto dos sobrecar¬gas da EIC aí instalados, tenta, através do Co-Hong (Gonghang 公行), em vão, falar com o mandarim, regressando à Taipa cerca de um mês depois, em 16 de Dezembro. Já em Macau o Comodoro entrega ao Hopu (Hubu 户部) uma carta traduzida para chinês dirigida ao vice-rei de Cantão, ameaçando o oficial da alfândega de Macau que subiria a Cantão no seu barco caso a missiva não fosse entregue ao seu destinatário. Dois dias depois, uma frota de dezoito juncos desce ao Canal da Taipa transportando enviados do vice-rei de Cantão que se encontram com Anson, que, por sua vez, ameaça quer as autoridades chinesas, quer indirectamente a Cidade do Santo Nome de Deus com a força do seu barco de guerra caso essa mesma embarcação não seja reabastecida e reparada. A permissão do vice-rei chega em 6 de Janeiro de 1743, e, em 19 de Abril, encontrando-se o barco pronto para viajar, Anson deixa a rada de Macau, afirmando estrategicamente que se dirige para Batávia para regressar três meses mais tarde, em 11 de Julho, com o galeão espanhol Nuestra Señora de Cobadonga, que tomara nas Filipinas, em 30 de Junho, enquanto este fazia a viagem Acapulco-Manila carregado de mercadoria. O comodoro, lutando novamente contra as exigências dos chineses, dirige-se, três dias depois, à Boca do Tigre, onde pede mantimentos e permanece algum tempo à espera dos mesmos, visitando Whampoa (Huangpu 黃埔) e Cantão até regressar a Macau e partir, posteriormente, após mais uma estada de seis meses nos mares da China, para Inglaterra, onde chega em Junho de 1744. O relato da viagem do Comodoro Anson, atribuído a Richard Walter, capelão do H. M. Centurion, mas redigido, segundo alguns estudiosos, por Benjamin Robins, e publicado em 1748, espelha a atitude inglesa em relação à China, um país considerado intolerante, enquanto a administração mandarínica reforça a vigilância de Macau para evitar a entrada de mais barcos ‘bárbaros’ no Império do Meio através de Macau. O texto atribuído a Richard Walter descreve a estada da tripulação em Macau, e, tal como os autores dos relatos da embaixada de Lord Macartney farão mais tarde, refere a riqueza de que a cidade gozara no início da ocupação portuguesa e a decadência em que então se encontra, permanecendo os portugueses no enclave com autorização dos chineses, que podem, quando o entendem, bloquear a entrada de comida obrigando assim o governador a obedecer-lhes. A obra é traduzida para francês em 1751, ilustrada com uma gravura da cidade vista do mar, onde o Centurion se encontra representado, com base na gravura de Nieuhoff (1665). No que diz respeito às consequências da viagem do Centurion pelo globo e pelos mares da China Meridional, e de entre os muitos exemplos de obras que reflectem e aplaudem o resultado da expedição, John Campbell publica Navigantium atque Itinerantium Bibliotecha: or, A Compleat Collection of Voyages and Travels (1744-1748), na qual glorifica as façanhas marítimas inglesas e descreve o interesse crescente das nações europeias no comércio, sobretudo com a China, servindo-se ainda das muitas inconveniências enfrentadas pelo comodoro Anson em Macau, das dificuldades da circum-navegação e das relações com as autoridades chinesas para provar a capacidade dos ingleses, que futuramente deverão seguir o exemplo do comodoro pelos mares, honrando a Inglaterra. Bibliografia: WALTER, Richard, A Voyage Round the World in the Years MDCCXL, I, II, III, IV, by George Anson, (Londres, 1748); WALTER, Richard, Anson’s Voyage Round the World, introdução e notas de G. S. Laird Clowes, (Londres, 1928); MORSE, Hosea Ballou, The Gilds of China, (Nova Iorque, 1909); MORSE, Hosea Ballou, The International Relations of the Chinese Empire, vol. 1: The Period of the Conflict 1834- 1869, (Londres, 1910); MORSE, Hosea Ballou, The Chronicles of the East India Company Trading to China 1635-1834, vol. 1, (Oxford, 1926); SOMMERVILLE, Boyle, Commodore Anson’s Voyage into the South Seas and Around the World, (Londres, 1934); WILLIAMS, Glyndwr (ed.), Documents Relating to Anson’s Voyage Round the World 1740-1744, (Londres, 1967); WILLIAMS, Glyndwr (ed.), “Anson at Canton, 1743: ‘A Little Secret History’”, in CLOUGH, Cecil P.; HAIR, P. E. H. (eds.), The European Outhrust and Encounter: The Firts Phase (c. 1400-c. 1700), (Liverpool, 1994), pp. 271-290; WILLIAMS, Glyndwr, The Prize of all Oceans: The Triumph and Tragedy of Anson’s Voyage Round the World, Harper Collins, (Londres, 1999); SUMAREZ, Philip, Log of the Centurion Based on the Original Papers of Captain Philip Saumarez on Board HMS Centurion, Lord Anson’s Flagship During his Circumnavigation 1740-44, (Londres, 1973); EAMES, James Bromley, The English in China, (Londres, 1974); LOYD, Christopher, “Introduction”, in SUMAREZ, Philip, Log of the Centurion. Based on the Original Papers of Captain Philip Saumarez on Board HMS Centurion, Lord Anson’s Flagship during his Circumnavigation 1740-1744, (1973), pp. 10-13.
ANSON, BARÃO GEORGE (1697-1752)
BEAUVOIR, CONDE LUDOVIC DE (1846-1929). Visita Macau como acompanhante do duque de Penthiève, primo do rei de Portugal por via materna, em 1867, regressando a França nesse mesmo ano, de onde partira, em 1866, para dar a volta ao mundo. Em 1869, o conde de Beauvoir publica Australie et Java, Siam, Canton, em dois volumes, e três anos mais tarde, Pékin, Yeddo, San Francisco, a terceira parte da sua viagem. O viajante chega ao “pavilhão europeu” a bordo do vapor norte-americano Fire- Dart, em 11 de Fevereiro de 1867, e deambula pelas principais atracções turísticas da cidade, incluindo os barracões onde permanecem os cules antes de serem enviados para o continente americano, prática longamente descrita e criticada. Pelas ruas de Macau, Beauvoir compara as casas de granito a prisões, observando macaenses e mestiços no exterior, onde, após o pôr-do-sol, nada há para ver senão os teatros chineses, descritos pelo autor, embora mais tarde, descreva também as casas de jogo da cidade, Mónaco da China e península em forma de uma pegada humana. São ainda referidos e descritos os fortes, as igrejas e os templos da cidade, bem como a Praia Grande, a Gruta do poeta exilado (Camões), no topo da qual se encontra um “observatório”; a paisagem humana adornada pelas mulheres cobertas de mantilhas e a população do território (125 mil chineses, dois mil portugueses). Breves apontamentos históricos referem a fundação portuguesa da cidade; a morte do governador Ferreira do Amaral; as ocupações militares inglesas da cidade (1802, 1808) e a fundação de Hong Kong, que “mata” o antigo entreposto português, antes da descrição da chegada do autor a Cantão, a bordo de uma canhoneira cedida pelo governador José da Ponte e Horta. Bibliografia: BEAUVOIR, Conde de, Voyage Autour du Monde, (Paris, 1869-1870); BEAUVOIR, Conde de, Java, Siam, Canton, (Paris, 1872); BEAUVOIR, Conde de, Pékin, Yeddo, San Francisco, 5.ª edição, (Paris, 1872); LOMBARD, Denis, “O Conde de Beauvoir e Macau (Fevereiro de 1867): Impressões de Macau do Conde de Beauvoir”, in Revista de Cultura, 2.ª série, n.° 23, (Macau, Abril-Junho de 1995), pp. 96-110.
BEAUVOIR, CONDE LUDOVIC DE (1846-1929)
BRAGA, MARIA ONDINA SOARES FERNANDES (1932-2003). Maria Ondina Soares Fernandes Braga nasceu em Braga em 1932 e estudou na Alliance Française em Paris, licenciando-se em língua inglesa pela Royal Asiatic Society of Arts de Londres. Foi professsora de Inglês e de Português em Angola, Goa e Macau, residindo em Lisboa desde 1965. Macau e a China estão bem patentes na obra da escritora, que viveu em ambos os locais: entre 1961 e 1965 em Macau, onde foi professora no Colégio Santa Rosa de Lima, e em 1982, em Pequim, tendo leccionado na Secção de Português do Instituto de Línguas Estrangeiras. Em 1965 publicou o seu primeiro livro, Eu Vim para Ver a Terra, no qual reune crónicas de Angola, Goa e Macau. Três anos depois é a vez de dar à estampa alguns contos de inspiração chinesa, escritos em Macau, na obra A China Fica ao Lado, com diversas edições, e traduzida para chinês em 1991. Nesse mesmo ano publicou Nocturno em Macau, obra galardoada com o Prémio Eça de Queirós, da Câmara Municipal de Lisboa. A notória ligação de Ondina Braga à China passa ainda pelo facto de, mesmo a sua autobiografia romanceada, que mais tarde viria a constituir o livro Estátua de Sal, ter sido escrita em Macau (1963), sem, naturalmente, deixar de referir a sua Angústia em Pequim, publicada em 1984. Ciclo este da vida da escritora de alguma forma fechado com Passagem do Cabo (1994), em que, tal como no seu primeiro livro, reune crónicas de Angola, Goa e Macau, sendo, no entanto, patente uma postura de despedida dessas terras que viu. Em Março de 1990, Ondina Braga voltou a Macau, o que se repetiria no ano seguinte, por ocasião do lançamento da versão bilingue de A China Fica ao Lado. As impressões que então colheu da terra que lhe fora tão familiar estão registadas em diversos artigos, crónicas e entrevistas publicados na imprensa local e nacional, de que também foi colaboradora assídua. No Território, Ondina Braga tem publicação dispersa, ao nível literário e ensaístico, nomeadamente na Revista de Cultura e na Macau. Sendo uma das contistas portuguesas mais prestigiadas e galardoadas da actualidade, Maria Ondina Braga, desenvolveu, com igual êxito, a novela, a crónica, a narrativa, a biografia, o ensaio e a tradução. A sua colectânea de contos, A Filha do Juramento, composta por três livros, sendo o segundo deles dedicado à China, publicada em 1995 na cidade de Braga, assinalou a passagem do 30.° aniversário da carreira literária da autora que, entretanto, retomou a vertente autobiográfica e memorialista ficcionada em Vidas Vencidas. – Principais Obras. Romances: Nocturno em Macau, 1991 (2.ª ed., 1993); A Personagem, 1978. Contos: A China Fica ao Lado, 1968 (4.ª ed., 1991); Amor e Morte, 1970; A Revolta das Palavras, 1975; A Filha do Juramento, 1995. Crónicas: Eu Vim para Ver a Terra, 1965; Passagem do Cabo, 1995. Novelas: Os Rostos de Jano, 1973; A Casa Suspensa, 1982; Lua de Sangue, 1986. Narrativa: Angústia em Pequim, 1984 (2.ª ed., 1988). Autobiografias e memórias romanceadas: Estátua de Sal, 1969 (3.ª ed., 1983); Vidas Vencidas, 1999. Publicação de conjunto: A Rosa-de-Jericó (contos escolhidos), 1992. Bibliografia: SENA, Tereza; BASTO, Jorge, Macau nas Palavras, (Macau, 1998).
BRAGA, MARIA ONDINA SOARES FERNANDES (1932-2003)
| Personagem: | Conceição, Deolinda do Carmo Salvado da, 1913-1957 |
| Tempo: | Época da República entre 1911 e 1949 |
| Após o estabelecimento da RPC em 1949 até 1999$ |
| Fonte: | Dicionário Temático de Macau, Volume I, Universidade de Macau, 2010, p. 394. ISBN: 979-99937-1-009-6 |
Caros membros do website "Memória de Macau", olá!
Agradecemos o vosso apoio e confiança ao longo do tempo ao website de Cultura e História "Memória de Macau". A fim de otimizar a qualidade dos serviços a prestar aos membros e proteger os seus direitos e interesses, será implementada, oficialmente, uma nova versão dos "Termos e Serviços" que entrou em vigor a 28 de Abril de 2025. Por favor, leiam o texto completo da versão actualizada. O conteúdo pode ser consultado aqui:
👉 Clique aqui para tomar conhecimento da versão actualizada dos "Termos e Serviços"
Li, concordo e aceito o conteúdo actualizado dos "Termos e Serviços".
Caso tenha alguma dúvida sobre a versão atualizada, não hesite em contactar-nos.
Agradecemos o vosso contínuo apoio e confiança. O website de Cultura e História "Memória de Macau" continuará a prestar serviços aos seus membros de forma segura e conveniente.
Com os melhores cumprimentos,
Website de Cultura e História "Memória de Macau"
Data de actualização: 28 de Abril de 2025
Instruções de uso
Já tem a conta da "Memória de Macau"? Login
Comentários
Comentários (0 participação(ões), 0 comentário(s)): agradecemos que partilhasse os seus materiais e histórias (dentro de 150 palavras).